Portela homenageará Clara Nunes.


A Portela fará uma grande homenagem a cantora Clara Nunes. A agremiação
azul e branco de Madureira, levará para Sapucaí na segunda-feira de folia o
enredo “Na Madureira moderníssima, hei
sempre de ouvir cantar uma Sabiá”
. O enredo é de autoria da
carnavalesca Rosa Magalhães.

Vinte e duas vezes campeã do carnaval carioca, a
Portela, fará um desfile exclusivamente homenageando, Clara Nunes, um dos
grandes nomes da história da agremiação.

O desfile vai ressaltar a diversidade da sua trajetória
biográfica e seu grande repertório musical, constituído de sambas canção,
sambas –enredos, partidos – altos, marchas-rancho, forrós, xotes, canções de
influência dos pontos de umbanda e do candomblé.
SINOPSE

A Portela vai apresentar no carnaval de 2019 uma homenagem à cantora Clara
Nunes, ressaltando a diversidade e a atualidade de sua trajetória biográfica
e seu vasto e plural repertório musical, constituído de sambas-canção,
sambas-enredo, partidos-altos, marchas-rancho, forrós, xotes, afoxés,
repentes e canções de influência dos pontos de umbanda e do candomblé. Para
isso, pretende sair do lugar-comum das narrativas sobre sua vida ou de uma
colagem de títulos de sua discografia. Nossa escola exalta a importância
cultural de Madureira, das festas, terreiros e do contagiante carnaval
popular, enfatizando a contribuição do bairro para a formação da identidade
que caracterizou Clara Nunes: a brasilidade.

O meu lugar,
tem seus mitos e seres de luz.
É bem perto de Oswaldo Cruz*

Em 1924, no primeiro carnaval da Portela, fundada em abril do ano anterior, o
coreto de Madureira, criado pelo cenógrafo José Costa, reproduzia a imponente
Torre Eiffel. Visitando o bairro na companhia de alguns amigos, Tarsila do
Amaral não apenas eternizou aquela imagem numa tela, como também mostrou para
seus pares modernistas que as festas populares do nosso subúrbio incorporavam
os mais diversos elementos culturais. Sem dúvida, Madureira sempre teve um ar
moderno, como a própria trajetória de Clara Nunes, que parece ter emergido de
uma obra modernista, como se fosse uma tela da Tarsila: a Mineira representa
a mais plural expressão da brasilidade. Morena. Mestiça.

Porque tem um sanfoneiro no canto da rua,
fazendo floreio pra gente dançar,
tem Zefa da Porcina fazendo renda
e o ronco do fole sem parar**

Clara nasceu no interior mineiro, num lugar que hoje se chama
Caetanópolis. Ainda menina, trabalhou numa fábrica de tecidos para conseguir
sobreviver, mas seu destino já estava traçado. Tinha como missão cantar o
Brasil! Ao longo da infância, conheceu de perto as tradições culturais e as
festas folclóricas interioranas, certamente recebendo influência de seu pai,
Mané Serrador, mestre de canto de Folia de Reis e violeiro dos sertões das
Gerais. Sua brasilidade, como herança de sua origem, sempre valorizou a
diversidade regional de nosso país. A voz de Clara fez ecoar os ritmos do povo,
na saborosa confusão dos mercados populares, seja do nordeste ou de qualquer
outro recanto desta nação.

Alçando voos mais ousados, Clara mudou-se para Belo Horizonte, onde
participou de concursos, realizou os primeiros trabalhos artísticos e
conquistou espaço nos meios de comunicação. Chegando ao Rio de Janeiro,
seguiu fazendo sucesso e conheceu o misticismo que aflorava em Madureira,
incorporando-o à sua identidade.

Sou a Mineira Guerreira,
filha de Ogum com Iansã***

Até então, a artista cantava principalmente boleros e sambas-canções.
Após ter contato com o ancestral universo afro-brasileiro de Madureira, a
mineira se transformou igual ao céu quando muda de cor ao entardecer. E nunca
mais foi a mesma: visitou os terreiros, quintais e morros de Oswaldo Cruz e
Madureira, vestiu-se de branco, incorporou colares, turbantes e contas,
cantou sambas e pontos de macumba. Seu repertório se expandiu. A imagem de
Clara evocando os Orixás, irmanada ao povo de Santo, eternizou-se na memória
de seus fãs. Ela se tornou a Guerreira que não temia quebrantos, dançando
feliz pelas matas e bambuzais, sambando descalça nas areias da praia, unindo
a essência negra de Angola ao subúrbio carioca. E assim, sua voz rapidamente
se espalhou. Seu canto correu chão, cruzou o mar, foi levado pelo ar e
alcançou as estrelas. Uma força da natureza que brilhou como um raio nos
palcos e terreiros, iluminando o coração dos portelenses. Nada disso foi por
acaso.

Portela, sobre a tua bandeira
esse divino manto.
Tua Águia altaneira
é o Espírito Santo
no templo do samba****

Desde que foi fundada, a Portela tem uma presença significativa de
elementos típicos do mundo rural, trazidos pelo povo simples do interior,
sobretudo do interior de Minas Gerais, mesclados à negritude que vibrava em
Madureira. Talvez tenha sido por isso que a identificação de Clara com a
Portela foi imediata. Ela sempre ocupou posição de destaque nos desfiles, é
madrinha da Velha Guarda e até puxou sambas-enredos na avenida. Ela e os portelenses,
famosos e anônimos, sempre caminharam de mãos entrelaçadas, voando nas asas
da Águia. Um dia, inesperadamente ela partiu. Trinta e cinco anos se passaram
desde então. A dor da saudade sempre reverberou no coração de todos,
tornando-a uma estrela ainda mais cintilante. Agora está na hora de a
Guerreira reencontrar seu povo mestiço, para mais uma vez brilhar na avenida.
Vestida com o manto azul e branco e a Águia a lhe guiar, voa minha Sabiá.

Até um dia!

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